Opinião

STF e a decisão sobre patentes

Resultado garante economia ao SUS, mas pode representar desestímulo às áreas de pesquisa

31 de maio de 2021

Por Jacqueline Gottschalk*

Artigo publicado originalmente no Estadão

Em 28 de abril de 2021, o plenário do STF julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.529, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra dispositivo da Lei de Patentes (Lei 9.279/1996) que estabelece que o prazo de vigência da patente não será inferior a 10 anos para invenção e a sete anos para modelo de utilidade.

Na ação, a PGR argumenta que o parágrafo único do artigo 40 da norma, ao invés de promover condução célere e eficiente dos processos administrativos, admite e, de certa forma, estimula o prolongamento exacerbado do exame de pedido de patente.

O parágrafo único do artigo 40 da Lei 9.279/96 dispõe sobre a vigência de patentes nos termos seguintes:

“Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 (quinze) anos contados da data de depósito.

Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior.”

A patente dá ao titular o direito de monopólio sobre a sua invenção e impede a reprodução ou comercialização do produto durante determinado período, em que o dono recebe os chamados royalties.

Pela Lei de Propriedade Intelectual, as patentes de invenção, por exemplo, duram 20 anos contados a partir da data de depósito no INPI, ou pelo menos 10 anos após a data de concessão. Ou seja, se houver atraso na concessão, a demora é compensada com mais anos de monopólio.

Dessa forma, se uma empresa farmacêutica criasse um novo medicamento e esperasse 15  anos pela concessão da patente, teria mais 10 anos para usufruir do direito conquistado. Na prática, acabaria tendo exclusividade por 25 anos (15 +10). E, durante os 15 anos de espera, apesar da empresa não deter o registro formal, poderia explorar seu invento.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, no julgamento, sustentou que a possibilidade de a patente vigorar por prazo indeterminado viola o artigo 5º, inciso XXIX, da Constituição Federal, segundo o qual a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização. Segundo ele, a Constituição não define o tempo de exclusividade, mas impõe que seja estabelecido tempo certo, definido e previsível, sob pena de prejudicar a inovação tecnológica e o desenvolvimento socioeconômico, em flagrante prejuízo ao mercado nacional.

Nesse sentido, o ministro relator Dias Toffoli, do STF, concedeu liminar no dia 7 de abril de 2021 que veda ao INPI conceder a extensão do prazo de patentes a medicamentos e produtos da área da saúde.

Portanto, se uma empresa criar hoje um remédio para Covid-19 e solicitar hoje o registro, terá no total 20 anos de direito à exclusividade, a partir do depósito do seu pedido, sem levar em conta o tempo que o INPI demorar para conceder a patente.

No caso de patentes já concedidas, o STF ainda irá definir se o fim do direito ao “seguro” de 10 anos valeria somente para medicamentos relacionados à Covid-19 ou a todos em geral. As invenções de empresas que possuem o “plus” de 10 anos cairão em domínio público.

No dia 12 de maio de 2021, por oito votos a três, STF aprovou decisão que modula (decide que não retroage) os efeitos da decisão que considerou inconstitucional o parágrafo único do artigo 40 da Lei de Propriedade Industrial. De acordo com o entendimento do STF, serão mantidas as extensões de prazo concedidas na lei, mantendo a validade das patentes já deferidas e ainda vigentes, de forma que a decisão só passe a valer a partir da publicação da ata do julgamento. Mas o mesmo não se aplica aos prazos extras concedidos em patentes de medicamentos e equipamentos de saúde.

Concluindo, a declaração de inconstitucionalidade opera com efeitos retroativos nos seguintes casos:

I) Patentes relacionadas a produtos e processos farmacêuticos e equipamentos e/ou materiais de uso na área da saúde;

II) Patentes deferidas por meio de ação judicial em curso;

III) Pedidos de patentes já depositados e ainda em tramitação no INPI;

IV) Novos pedidos de patentes depositados após a declaração de inconstitucionalidade.

Com base no julgamento acima, haverá uma enorme economia para o Sistema Único de Saúde (SUS), já que vários medicamentos cairão em domínio público e surgirão mais genéricos.

Por outro lado, a redução do período de vigência da patente pode representar um desestímulo às áreas de pesquisa e desenvolvimento no Brasil.

*Jacqueline Gottschalk, advogada da área societária no Diamantino Advogados Associados

 

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