Por Nelson Wilians*
Artigo publicado originalmente na Folha
“Os guerreiros vitoriosos vencem primeiro e depois vão para a guerra, enquanto os guerreiros derrotados vão primeiro para a guerra e depois procuram vencer.”
A frase acima é de um antigo general chinês, Sun Tzu, conhecido por sua estratégia de vencer o inimigo usando outros métodos que não somente a força bruta.
Pela perspectiva de Sun Tzu, ao mandar bombardear a Ucrânia, Putin foi primeiro à guerra com a intenção de dobrar o país vizinho apenas com a brutalidade.
Para o presidente russo estava na hora de romper a ordem internacional estabelecida no fim da Segunda Guerra Mundial e durante a Guerra Fria. Poderia ter vencido essa batalha antes de colocar suas tropas na Ucrânia. Porém, como observa a professora de direito internacional Maristela Basso, “se impunha majestosa, então, para ele, a necessidade de escrutinar a chamada Pax Americana”.
Putin está autocondenado a repetir o passado.
A Ucrânia recorda a Hungria de 1956. Após a população húngara se reunir em Budapeste e pôr abaixo uma estátua gigante de Stalin — o maior monumento a ele no mundo — Nikita Khrushchov, ouvindo o grito de independência húngaro, ordenou o esmagamento imediato da capital daquele país. Rapidamente, milhares de pessoas estavam mortas. Khrushchov determinou ainda uma terrível perseguição a todos que lutavam por liberdade.
A Hungria enviou milhões de cidadãos para o Ocidente como refugiados, da mesma forma que a Ucrânia agora. Até hoje não se sabe realmente quantas pessoas foram mortas na invasão de 1956, sabe-se apenas que foram muitos milhares.
Isso pode acontecer também na Ucrânia com o enterro de incontáveis corpos em valas.
As constantes falsidades ditas pelo presidente russo, sob o pretexto de “desnazificar” a Ucrânia, lembram as contadas na Hungria pelo líder da KGB Iúri Andropov, que se tornaria mais tarde chefe de Putin.
Câmeras de TV e celulares captam atrocidades em ataques a hospitais e alvos civis ucranianos. O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, acusou soldados russos de “estuprar mulheres em cidades ucranianas”. O estupro é uma tática de guerra repugnante, que transforma o corpo da mulher em território dominado. Não por acaso, desde 1998 a violência sexual é tipificada como crime contra a humanidade.
Por isso, causa indignação quando um deputado brasileiro viaja milhares de quilômetros até a Ucrânia e protagoniza um evento paralelo à guerra de envergonhar a todos os brasileiros.
Além de produzir coquetel molotov na Ucrânia, o que pode significar violação de dispositivos diplomáticos, Mamãe Falei viu no sofrimento do povo ucraniano uma possibilidade de se aproveitar do infortúnio de suas mulheres.
Não há assimetria comportamental entre os soldados russos e o Mamãe Falei.
O autocrata russo de bombas na mão enxergou na violência a distância mais curta para atingir um novo conceito geoestratégico.
Sun Tzu, que significa “mestre”, é autor de “A Arte da Guerra”, o mais antigo tratado militar e que tem sido usado como um guia sistemático para a guerra. Seu livro enfatiza o quão importante é realmente conhecer seu inimigo e usar o cérebro sobre os músculos o máximo possível.
Em termos de perspectiva histórica, o tempo irá revelar a gravidade da ação de Putin e suas tropas na Ucrânia e se, ao contrário de um estrategista, ele apenas utilizou os músculos nessa guerra.
Com certeza, o mandatário russo deu uma grande lição ao mundo, que pode ser resumida em outra frase de Sun Tzu: “Quem deseja lutar deve primeiro calcular o custo”.
Até aqui o Ocidente tem demonstrado que não está disposto a oferecer uma oportunidade de ser derrotado por Putin, e que tem dever moral e obrigação humanitária de limitar os danos que a Rússia está causando à Ucrânia.
Mas não há nenhuma garantia de que o mundo se torne mais seguro.
A única oportunidade que pode surgir da barbárie na Ucrânia é a de se moldar uma nova arquitetura econômica. Antes, porém, é preciso atravessar o abismo que deve surgir entre os sistemas operacionais do Ocidente e os de outras potências, como a China e a própria Rússia.
Por enquanto, só há incertezas à frente. O que me leva a lembrar da frase do filósofo e poeta espanhol George Santayana: “só os mortos viram o fim da guerra”.
*Nelson Wilians é empreendedor e advogado