Por Nelson Wilians*
Artigo publicado originalmente na Folha
Parafraseando José Coutinho, que certa vez disse “o bom jogo de futebol é disputado palmo a palmo; o ruim, sola a sola”, uma boa eleição é lembrada por seus projetos de governo. A ruim, pela baixaria das paixões ideológicas.
As eleições presidenciais estão previstas apenas para outubro de 2022. Mas a movimentação do tabuleiro político já é intensa. Recentemente, o governador de São Paulo, João Doria, venceu as prévias tucanas. O ex-presidente Lula foi recebido como estadista em viagem recente pela Europa. Após idas e vindas, o presidente Jair Bolsonaro acertou sua filiação ao PL. E o ex-ministro Sergio Moro agora integra o Podemos.
Mais que estratégias ou articulações, o Brasil necessita de um amplo debate de ideias e propostas, e que os candidatos apresentem os seus projetos para o país. É preciso analisar atentamente todos os detalhes. Essa polarização de que tanto se fala e o radicalismo são perigosos e improdutivos. São vários os exemplos negativos.
A última eleição norte-americana ficou marcada pela invasão de um grupo de apoiadores de Donald Trump ao Capitólio. O ataque deixou cinco mortos, dezenas de feridos e centenas de presos. Por aqui, tivemos o atentado contra Bolsonaro às vésperas do 1º turno, em 2018. No mesmo ano, dois ônibus que participavam de uma caravana de Lula no Paraná foram atingidos por tiros. Sem falar nos constantes ataques a ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), na guerra das redes sociais e na propagação de fake news.
De acordo com o levantamento “Guerras Culturais”, da Ipsos, divulgado em agosto, a cada dez brasileiros, oito dizem acreditar que há uma tensão elevada no país entre pessoas que defendem partidos diferentes. O percentual supera a média global de 28 países. Esses números são preocupantes.
É preciso comparar governos, planos, realizações – claro, sem ignorar as circunstâncias e o contexto de cada período. A população está cansada de velhos discursos e maniqueísmos. Não há estrutura que se sustente enquanto o desemprego e a inflação batem à porta. E aqui trago um conceito que adaptei do mercado para a advocacia – e vou também adequá-lo aos candidatos: “não venda o que não pode entregar e não prometa o que não pode cumprir”.
E contra a polarização muito se fala em uma terceira via para as eleições. Aqui não cabe defender A, B ou C. Pouco importa a denominação. É indispensável que o eleitor pesquise, leia, analise. E que levem em conta os seus anseios. Nunca se teve tantas informações disponíveis. O fato é que o cidadão não aguenta mais essa discussão que não leva a lugar algum. E sobre isso, vale destacar que os candidatos precisam ter responsabilidade e respeito ao apresentarem os seus programas aos eleitores, pois como determina a Constituição Federal, em seu primeiro artigo, parágrafo único: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”.
Bolsonaro, no Planalto, e Doria, em São Paulo, enfrentaram a mais grave pandemia desde a Gripe Espanhola. Mesmo diante das dificuldades, construíram um legado? Merecem o apoio da população? Poderiam ter feito mais? Os avanços sociais com Lula são inegáveis. Mas e os casos de corrupção em seu governo? Foram inventados pela oposição, pela mídia ou de fato “os fins justificam os meios”?
Os casos mencionados são amplamente reconhecidos pela sociedade, situações específicas de grande repercussão, de modo que tais indagações só poderão ser respondidas pelo eleitor.
Foto: Bruno Van Enck