Por Gustavo D. C. Biglia e Bruno Zampieri F. Ottoni*
Artigo publicado originalmente no Estadão
O aumento da alíquota do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) tem sido uma tendência ao longo dos últimos 5 anos. Dessa forma, os processos de doações e o recebimento de heranças têm se tornado cada vez mais onerosos para as famílias brasileiras.
Como exemplo das alterações que ocorreram, não menos do que 11 Estados da federação já haviam aprovado a alteração em suas alíquotas. As mudanças variaram da simples alteração da alíquota até novas regras que implicam o estabelecimento de regras progressivas do imposto, levando em consideração que o STF firmou entendimento acerca da possibilidade de sua progressão.
No caso do Estado de São Paulo, em meados de 2016, foram realizadas medidas no intuito de não realizar o aumento das alíquotas do ITCMD. Uma dessas medidas foi um convênio firmado com a União para que fosse possível o cruzamento de dados recebidos da Receita Federal com aqueles obtidos pela Secretaria da Fazenda, de modo a intensificar a fiscalização de casos passíveis de aplicação do tributo, o que já impulsionou a arrecadação de contribuições.
Entretanto, aproveitando-se desse cenário de pandemia da covid-19 que assola o Brasil nos últimos meses e, inclusive, utilizando da justificativa de que os recursos seriam destinados à saúde para financiar os estudos de combate ao vírus, foi proposto o Projeto de Lei nº 250/2020, de autoria dos deputados Paulo Fiorilo e José Américo, que, além de realizar o aumento das alíquotas do ITCMD de forma progressiva, propõe também a incidência deste sobre os valores recebidos a título de plano de previdência complementar, como por exemplo o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), o que não está previsto nas normas atualmente vigentes. Importante dizer que, além desse projeto, já tramitava na mesma casa o Projeto de Lei nº 1.315/2019, de autoria da deputada Monica da Bancada Ativista, que propõe apenas majoração progressiva do ITCMD. Ou seja, de uma forma ou outra, ainda que o aumento da fiscalização tenha trazido um aumento na arrecadação, o Estado de São Paulo seguirá a tendência dos demais Estados da federação de aumentar a alíquota desse imposto.
Em um grave contexto de crise pandêmica internacional gerada pela covid-19, nota-se que as autoridades paulistas caminham em sentido totalmente contrário às práticas de outros países mais afetados pela crise sanitária e econômica.
Como exemplo, podemos citar o EUA, que suspendeu as execuções hipotecárias e despejos até o final de abril e, em conjunto com tal medida, o Federal Reserve (banco central dos EUA) reduziu as taxas de juros para quase zero e injetaram liquidez no mercado, totalizando US$ 700 milhões, por meio da compra de títulos hipotecários e do tesouro, anunciando a retomada de seu programa de compra de dívida corporativa, implementado pela primeira vez durante a crise de 2008. Já no continente europeu, medidas emergenciais também foram adotadas, como é o caso do Reino Unido, anunciando que seu governo garantirá US$ 400 bilhões em empréstimos a empresas afetadas pela pandemia, quantia esta que representa cerca de 15% do PIB do país. Além disso, a monarquia parlamentarista suspendeu também a exigência de pagamentos de hipotecas por três meses para pessoas com más condições financeiras, e injetará bilhões em ajuda direta e subsídios a pequenas empresas, além de conceder isenções fiscais por um ano.
Em um cenário de enfraquecimento econômico onde todos têm sofrido de forma exponencial com as medidas de quarentena adotadas conforme as indicações da Organização Mundial da Saúde, com a aprovação de projetos que propõem o aumento de alíquotas tributárias, fica claro o impacto direto no bolso do povo paulista.
Vale dizer que isso afetará também as famílias que estão pretendo realizar o seu planejamento patrimonial caso um dos Projetos de Lei seja aprovado na Assembleia Legislativa, uma vez que o Estado, por ser um dos mais importantes da federação, tem seus bens mais valorizados do que em outros Estados, fazendo com que a população paulista, que já arca com altos custos de vida, pague ainda mais quando for realizar a transferência do seu patrimônio para seus descendentes.
Atualmente, no caso da sucessão de bens de herança que totalizam R$ 3 milhões, o ITCMD incidente sobre essa transferência será de, aproximadamente, R$ 120 mil. Já caso o Projeto de Lei nº 250/2020 venha a ser aprovado, o ITCMD incidente será o dobro, ou seja, R$ 240 mil, e considerando o Projeto de Lei 1.315/2019, para o mesmo caso, o valor do ITCMD incidente seria de R$ 210 mil.
Assim, vale lembrar que uma das formas de aproveitar esse último momento com as alíquotas mais baixas do ITCMD é realizar seu planejamento sucessório, que visa antecipar as doações dos bens para seus herdeiros, preservando o relacionamento entre os entes familiares, protegendo mais o patrimônio, e evitando possíveis conflitos decorrentes de quem ficará com determinado bem.
*Gustavo D. C. Biglia e Bruno Zampieri F. Ottoni são advogados na área de Direito Societário, Contratos e M&A do escritório WZ Advogados