Opinião

Mudança que possibilita alteração imotivada do nome civil diretamente em cartório é avanço

“Tanto nos casos de modificação do prenome quanto nos do sobrenome, o pedido deve ser feito no cartório em que o interessado foi registrado”, escreve Jennifer Manfrin

17 de agosto de 2022

Governo do Maranhão/Divulgação

Jennifer Manfrin*

Todo aquele que já passou da adolescência sabe, por mais perfeito que um nome seja, em algum momento ele será contestado pelo seu portador. A irresignação quanto ao nome de batismo é quase tão certa quanto a morte e acontece tanto com Gabrielas quanto com Gabryellys. Não há dúvidas de que os pais, no momento da escolha do nome dos seus filhos, empregam tempo e dedicação, sendo raros os casos de registros de nomes que fogem a qualquer lógica como ocorreu com: Rolando Escada Abaixo, Janeiro Fevereiro de Março Abril, Restos Mortais de Catarina, entre outros.

O nome é composto pelo prenome e pelo sobrenome e, regra geral, sempre foi considerado imutável, salvo em casos específicos como: quando causasse constrangimento ao seu portador; na hipótese de um dos cônjuges adotar o sobrenome do outro após o matrimônio; em uma janela prevista no antigo artigo 56 da Lei de Registros Públicos, que permitia a sua alteração, sem justificativa, entre os 18 e os 19 anos de idade, mas que por ser pouco conhecida quase nunca era utilizada; ou ainda, mais recentemente, nos casos dos transgêneros. Assim, para aqueles que simplesmente não gostavam do nome, a solução muitas vezes era se conformar.

Porém, desde o dia 28 de junho de 2022, ninguém mais é obrigado a permanecer com um nome com o qual não se identifica. A Lei 14.382/2022 realizou uma verdadeira revolução na Lei de Registros Públicos, permitindo que seja feita a modificação do prenome e do sobrenome diretamente em cartório.

Nos termos da atual redação do artigo 56: “A pessoa registrada poderá, após ter atingido a maioridade civil, requerer pessoalmente e imotivadamente a alteração de seu prenome, independentemente de decisão judicial, e a alteração será averbada e publicada em meio eletrônico”.

A alteração do prenome, contudo, só pode acontecer uma vez pela via extrajudicial. Caso a pessoa se arrependa, ou tenha interesse em uma nova modificação, deverá procurar o Poder Judiciário.

Já as regras para modificação do sobrenome são um pouco mais limitadas, devendo respeitar os ditames do artigo 57, sendo possível quando a pessoa:

a) quer incluir sobrenomes familiares;
b) incluir ou excluir o sobrenome do cônjuge na vigência do matrimônio;
c) excluir o sobrenome do ex-cônjuge após a dissolução da união;
d) incluir ou excluir sobrenomes em razão da alteração da filiação.

Ademais, os companheiros que possuem união estável registrada possuem os mesmos direitos de alteração do sobrenome do que as pessoas casadas.

Outra novidade é que, prestigiando o princípio da socioafetividade, os enteados poderão adotar os sobrenomes de seus padrastos ou de suas madrastas, mas, nesse caso, o pedido deverá ser motivado.

Tanto nos casos de modificação do prenome quanto nos do sobrenome, o pedido deve ser feito no cartório em que o interessado foi registrado. Ademais, para garantir que essa possibilidade legal não seja usada para meios escusos, será exigida uma série de documentos e certidões, com a finalidade de garantir a lisura do procedimento. Desconfiando das razões pelas quais a pessoa pretende modificar seu nome, o oficial de registro recusará a retificação.

Interessante notar que essa possibilidade decorre principalmente da facilidade de manutenção e análise de documentos decorrentes da evolução tecnológica. Em outros tempos, seria praticamente impossível evitar que pessoas mal-intencionadas se utilizassem dessa medida para se furtar ao cumprimento de deveres legais.

Por fim, não há dúvidas de que essa modificação legislativa é um grande avanço, visto que possibilitar que qualquer pessoa maior de idade decida a forma pela qual quer ser chamada vai ao encontro da autonomia individual, do princípio da dignidade da pessoa humana e do respeito aos direitos da personalidade.

*Jennifer Manfrin é advogada, especialista em Direito Civil e professora nos cursos de pós-graduação em Direito do Centro Universitário Internacional Uninter

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