Por Gustavo Lanna*
A PEC 132/23 proibiu a concessão de incentivos fiscais em relação ao IBS em seu artigo 156. O racional que lastreia essa vedação é que os incentivos fiscais (meio de renúncia fiscal ou gasto tributário indireto) se constituem num mecanismo de distorção da competitividade dos contribuintes, além de, em geral, serem ineficientes por não atenderem às finalidades vinculadas à sua criação.
Essas premissas se baseiam em noção equivocada desse tipo de gasto tributário, à medida em que imunidades e regimes especiais de tributação como o Simples e o regime de tributação vinculado à Zona Franca de Manaus previstos na Constituição se enquadrariam como incentivos fiscais.
Entretanto, o conceito de incentivo fiscal, segundo a própria Receita Federal do Brasil (RFB) e a maior parte da doutrina, implica algum tipo de redução da carga tributária por meio de um regime de exceção às regras gerais, visando o fomento de determinada atividade, segmento, região ou população.
Esse tipo de renúncia fiscal é outorgado por lei, sempre, portanto a nível infraconstitucional e de forma discricionária pelos entes da Federação. Levando em conta esse conceito, torna-se inviável a RFB considerar valores de renúncia vinculados às imunidades, Simples e à Zona Franca de Manaus como gastos tributários, como costumeiramente o faz, inflando de forma equivocada os valores divulgados a título de renúncias fiscais e distorcendo a discussão acerca da validade da concessão desse tipo de renúncia.
Retomando a questão da vedação à concessão de incentivos fiscais via PEC 132/23, verifica-se que na prática, essa restrição pode interferir em pilares da reforma tributária. Não por outra razão, o Grupo de Trabalho da Câmara dos Deputados sobre a reforma tributária estuda a possibilidade da concessão de créditos presumidos (espécie de incentivo fiscal) para contribuintes dos segmentos de locação de veículos e de saneamento em relação à aquisição de ativo imobilizado. Essa medida respeita a isonomia, na medida em que resguarda a esses tipos de contribuintes uma tributação equânime e neutra em razão das peculiaridades de suas atividades.
Essa possibilidade, aliada à redução de alíquotas para determinadas atividades do segmento de incorporação e construção civil, também aventada na regulamentação da Reforma Tributária, comprova que a utilização de mecanismos de adequação da carga tributária visando a preservação da isonomia, neutralidade e fomento de certos setores da economia é medida salutar, que não deve ser ignorada pelo Legislativo.
Oxalá a vedação prevista na PEC 132/23 seja revista e seja compreendido que a concessão de incentivos fiscais por si só não é um problema. União Europeia, EUA e ainda o Brasil — vide o Mover — se utilizam desse tipo de política fiscal corriqueiramente.
A questão é a forma de controlar a concessão, manutenção e o atendimento às finalidades dos incentivos fiscais. Para tanto, já há o PLP 41/19, de autoria do senador Esperidião Amim (PP-SC), que altera a Lei de Responsabilidade Fiscal e cria uma série de regras para aprimorar esse controle. Basta a sua apreciação, melhoramento e votação na Câmara dos Deputados para viabilizar esse controle. Ao contrário do que pode parecer, ideias simples — vedar a concessão de incentivos fiscais — nem sempre são as melhores.
*Gustavo Lanna, sócio e head da área tributária do GVM Advogados, é Doutor em Direito Financeiro, Tributário e Econômico (USP), Mestre em Direito Público (PUC-MG) e professor de várias disciplinas da pós-graduação em Direito Tributário, Direito Público e Gestão de Tributos na PUC-MG.