Por Giovanna Mazetto Gallo*
Artigo publicado originalmente na ConJur
A ideia de que a governança corporativa é fundamental vem sendo difundida a cada dia, especialmente pela nova geração de empreendedores. Com a pandemia da Covid-19, tornou-se ainda mais evidente a importância de um sistema de governança sob medida para cada organização.
De fato, desde o início de qualquer negócio é muito importante identificar as funções e as responsabilidades dos sócios e colaboradores, bem como definir o processo de tomada de decisão. E isso já pode ser considerado um passo para a adoção de uma governança adequada.
Entre muitas vantagens, a adoção de governança corporativa por pequenas e médias empresas, bem como por startups, pode gerar economia de tempo e dinheiro, já que evita questionamentos e dúvidas sobre quem decide sobre determinado assunto ou quem é responsável por certa tarefa, reduzindo significativamente a probabilidade de divergência entre sócios, o que, muitas vezes, é causa de morte prematura do negócio.
Outro benefício evidente — e que tem levado muitos empreendedores a se preocupar com a governança desde o logo — é a promoção de confiança no investidor.
Reconhecendo a importância do tema e buscando facilitar a aplicação de determinadas práticas desde a criação e durante o desenvolvimento de novos negócios, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) divulgou, recentemente, um guia com práticas de governança corporativa para startups & scale-ups.
As startups, tão faladas na atualidade, são organizações com alto potencial econômico e inovadoras, ainda que não relacionadas ao setor de tecnologia. Aquelas startups capazes de superar as dificuldades mercadológicas, societárias, de produto, gestão ou regulamentação enfrentadas inicialmente, com um modelo de crescimento acelerado, tornam-se scale-ups.
As práticas de governança são divididas, no caderno do IBGC, em quatro grandes pilares: estratégia & sociedade; pessoas & recursos; tecnologia & propriedade intelectual; e processos & accountability. Para cada fase de desenvolvimento do negócio (ideação, validação, tração e escala), um ou outro pilar deve estar mais avançado.
Ainda que tais fases e pilares não estejam segregados de forma tão sistemática na mente do empreendedor, a aplicação das práticas de governança se torna mais fácil e intuitiva com os gráficos e checklists constantes no guia.
Na fase da ideação ou hipótese (em que o negócio não tem, necessariamente, atividade operacional, nem existência formalizada), o mais relevante, do ponto de vista de governança, é estruturar os papéis e as responsabilidades dos sócios, definindo formas de contribuição e intensidade de dedicação, remuneração e futura participação societária de cada um, bem como estabelecer mecanismos de saída. Assim, na ideação, os empreendedores devem focar nos pilares estratégia & sociedade e tecnologia & propriedade intelectual.
Na fase seguinte, de validação (também conhecida como Minimum Viable Product ou MVP, etapa de experimentação), o foco da governança deve estar em constituir a sociedade e estabelecer regras no que tange aos direitos e deveres dos sócios, e ter as primeiras reflexões sobre propósito. É também recomendável organizar práticas relacionadas a empregados-chaves, clientes e parceiros. Espera-se alcançar, durante a validação, um nível intermediário de governança nos pilares estratégia & sociedade e tecnologia & propriedade intelectual e um nível inicial nos pilares pessoas & recursos e processos & accountability.
Na etapa de tração (Product Market Fit ou PMF, em que o produto ou serviço está validado, e o crescimento da base de clientes e aumento do faturamento estão na mira), recomenda-se a definição de alçadas para a tomada de decisão, com estruturação do conselho (consultivo ou de administração) e evolução de práticas de planejamento e controles. Nesse momento, o pilar de governança estratégia & sociedade deve alcançar um nível mais avançado e os demais pilares, nível intermediário.
No último estágio, de escala (crescimento, podendo a sociedade passar a ser uma scale-up), a intenção é que todos os pilares de governança estejam desenvolvidos. A consolidação das práticas de governança certamente auxiliará o negócio a ganhar força e prosperar.
Assim, fica patente que o tema governança não deve estar limitado a grandes corporações. Também nas novas sociedades e pequenos empreendimentos, as melhores práticas são acessíveis e devem ser implementadas de acordo com a fase em que o negócio se encontra.
A governança, se adotada na medida certa, evita a criação de estruturas desnecessárias, ao mesmo tempo que gera valor, dá credibilidade ao investidor, aumenta a liquidez e reduz as chances de mortalidade da sociedade.
Giovanna Mazetto Gallo é advogada e consultora no escritório Wald, Antunes, Vita, Longo e Blattner Advogados.