Por Ricardo Tosto
Artigo publicado originalmente na ConJur
Integra a pauta diária dos problemas do país a questão dos precatórios, dos débitos fiscais e do volume de processos no Judiciário. E o cabimento de intervenção nos estados que descumprem suas obrigações — em conflito com a Constituição e com decisões do Supremo Tribunal Federal.
A solução é bem mais simples do que o tamanho do problema: a criação de um mercado controlado, transparente e com regras claras para resolver o drama dos credores que esperam há décadas para receber seus precatórios.
Ao deliberar sobre a hipótese de intervenção federal no estado de São Paulo (IF 2.915 e 2.953), o Supremo Tribunal Federal, há quase 20 anos, trouxe à tona um velho questionamento acerca do problema enfrentado pelos credores do governo. A intervenção federal nos estados que não honram o pagamento dos precatórios é a solução? É um assunto que continua em pauta.
No julgamento, por maioria, vencido o ministro Marco Aurélio, o Plenário decidiu, ao menos no caso de São Paulo, que não. Como ficou bem ressaltado nesse julgamento, a intervenção em nada resolveria o problema dos credores, pois com um interventor, ou com a manutenção do governador, os precatórios continuariam a ser pagos com a mesma morosidade, pois a situação financeira do Estado não permitiria que o interventor pagasse os valores já em muito atrasados.
Logicamente não se pode ignorar a situação financeira dos estados, dos municípios e da União. Por isso, a questão dos precatórios deveria ser solucionada com alternativas mais práticas e efetivas como a sua compensação com débitos fiscais atrasados.
A criação de um mercado controlado, transparente e com regras claras resolveria o drama dos credores que esperam há décadas para receber seus precatórios e o drama do governo que, na esmagadora maioria de casos, nunca receberá os débitos fiscais atrasados, pois para aqueles que já devem muito não há qualquer interesse em pagar o atual.
A compensação começaria a resolver efetivamente três grandes problemas: o dos precatórios, pois os credores negociariam seus “títulos”; o dos débitos fiscais, uma vez que os devedores do Fisco poderiam quitar seus débitos atrasados com a aquisição dos títulos com um certo deságio; e ainda ajudaria a desafogar o Judiciário, haja vista o grande número de execuções fiscais que seriam encerradas em virtude dessa compensação.
O encontro de contas é uma solução natural. Tanto que a própria Administração Pública vem considerando a possibilidade, mas de forma acanhada e hesitante. Em nível federal, a possibilidade foi admitida no âmbito de parcelamentos especiais, mas condicionada a negociação com a União.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional baixou normativa que permite o pagamento de débitos inscritos na dívida ativa em condições específicas, listadas na Portaria 9.917, de 14/4/2020.
Um problema dessa dimensão merece uma solução à altura. A eliminação desse entrave só traz vantagens para todos os envolvidos.
Ricardo Tosto é sócio fundador do Leite, Tosto e Barros Advogados Associados.