Dois projetos de lei, um da Câmara e outro do Senado, colocam em xeque a entrada em vigor na Lei Geral de Proteção de Dados prevista para agosto de 2020. Apesar da situação de exceção com a pandemia do coronavírus, adiar a entrada em vigor da LGPD pode causar ainda maiores impactos econômicos para o país?
Mesmo sem coronavírus, ainda no fim de 2019, foi proposto na Câmara o PL 5.762/19 para prorrogar a data da entrada em vigor de dispositivos da LGPD para agosto de 2022.
Já o senador Antonio Anastasia, presidente em exercício do Senado Federal, apresentou na segunda-feira (30) o PL 1179/2020, que dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do coronavírus (Covid-19). O PL, apresentado em caráter emergencial, traz várias alterações nas relações de direito privado, com o objetivo de suspender parcialmente a eficácia de legislações de direito privado. Em seu art. 25, propõe a prorrogação, em 12 meses, da entrada em vigor da LGPD.
Ainda há dúvidas quanto a aplicabilidade e eficácia da nova LGPD no Brasil. Porém, alguns juristas como o ministro Paulo de Tarso Sanseverino, do STJ, defendem que haverá uma nova onda de demandas ao Judiciário — algo similar ao número de consultas do Crédit Scoring (acima de 200 mil ações).
A perspectiva parece ser confirmada por um estuda da consultoria Gartner. O levantamento estima que 70% das empresas brasileiras não estarão, em agosto, prontas para atender às exigências da LGPD.
“Se as empresas e organizações não adotarem práticas apropriadas, haverá prejuízos financeiros e de reputação. É uma perspectiva inexorável. Na Europa, cujo sistema de proteção — o GDPR (General Data Protection Regulation) — serviu de base à LGPD e está em vigor há quase dois anos, já são diversos os casos de organizações multadas e atingidas por escândalos de reputação”, alerta Lucas Paglia, sócio da P&B Compliance.
Paglia alerta que “já existem contratos com empresas europeias sendo questionados e até não assinados tendo em vista a nossa ausência de leis de privacidade e ausência de segurança jurídica”.
“A prorrogação apresentada no PL 1179/20 tem justificativa razoável, qual seja, não onerar empresas em um momento de dificuldades financeiras. De toda forma, é importante que eventual prorrogação venha acompanhada de ações concretas no sentido de implementar a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e de esclarecer/regular os pontos deixados em aberto pela LGPD. Caso contrário, estaríamos apenas adiando o enfrentamento de uma realidade inevitável, sem tirar proveito dessa prorrogação”, diz Luiz Felipe Rosa Ramos, doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), CIPP/E e co-head de Proteção de Dados da Advocacia José Del Chiaro.