Enquanto se avolumam as queixas de usuários do PIX vitimados por golpistas, o Banco Central (Bacen), que disponibilizou em novembro passado a ferramenta de pagamento e transferência imediatos de fundos, anunciou que a partir de 29 de novembro as pessoas poderão usar o PIX para retirar dinheiro e obter troco em lojas e outros estabelecimentos. Teme-se que tal facilidade aumente ainda mais os crimes envolvendo o PIX. “Essa solução do Banco Central não vai ajudar em nada as vítimas. Limitar em mil reais a transferência noturna vai deixar a vítima em poder do sequestrador até o amanhecer”, afirmou Fenando Capez, diretor-executivo do Procon (Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor de São Paulo), em entrevista à Rádio Eldorado nesta terça-feira (14).
Em reunião nesta quarta-feira (15), 0 Procon-SP pediu ao Banco Central que limite as transações por meio do PIX a R$ 500 por mês.
Dados do próprio Banco Central apontam para um crescimento de pouco mais de 99% na quantidade de reclamações do PIX na comparação entre o quarto trimestre de 2020 (ou o primeiro de existência da tecnologia que permite a transferência instantânea) e o primeiro trimestre de 2021.
No entanto, até agora o Bacen se recusa a indenizar as vítimas de estelionatários e fraudadores. Segundo a instituição, o problema é dos bancos — que na verdade foram praticamente “atropelados” pelo lançamento precipitado do PIX pelo Bacen, uma ferramenta que concorre com algumas atividades bancárias.
Diante da avalanche de reclamações, o deputado federal Lucas Vergílio (Solidariedade/GO) protocolou dia 31 de agosto, junto ao presidente da Câmara dos Deputados, requerimento de informações (documento anexado) dirigido ao ministro Paulo Guedes, da Economia, questionando o que o Banco Central tem feito para evitar fraudes aos usuários do Sistema de Pagamento Instantâneo Brasileiro (PIX).
Dentre outras perguntas endereçadas a Paulo Guedes, o deputado indaga quais as medidas tomadas pelo Banco Central para evitar vazamentos de dados dos usuários dessa ferramenta.
Pergunta-se: perante o consumidor/usuário do PIX, o Banco Central responde ou não pelos prejuízos causados por falhas de segurança do sistema? Pelo uso da ferramenta por criminosos, para obter transferências de dinheiro que de outra forma não seriam feitas pela vítima?
Já o deputado estadual Campos Machado (Avante) apresentou, dia 3 de setembro, projeto de lei na Assembleia Legislativa de São Paulo para proibir temporariamente o uso do PIX em todo o estado até que o Banco Central anuncie novas medidas para tornar a ferramenta mais segura.
A advogada Sofia Coelho, especialista em direito público e do consumidor, e sócia de Daniel Gerber Advogados, lembra que o próprio Banco Central, em seu site https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/pix , “destaca a segurança como uma das características da ferramenta”.
Segundo ela, a atuação do Bacen inclui diversas funções, como autorizar e fiscalizar o funcionamento de outras instituições financeiras, garantindo, em tese, maior segurança aos clientes. “Portanto, se o consumidor foi vítima de uma fraude ou de um golpe e o Bacen falhou na fiscalização que lhe cabia, o Banco Central, deve, sim, ser responsabilizado civilmente pelos danos sofridos. Em outras palavras, existe nexo direto entre o dano causado e a ação estatal”, garante.
Fernanda Zucare, especialista em direito do consumidor, destaca por sua vez que na mesma velocidade com que o consumidor foi aderindo ao PIX, lançado em novembro de 2020 pelo Banco Central, “foi surgindo grande número de golpes eletrônicos através do PIX, demonstrando problemas de segurança e também entraves técnicos como, por exemplo, impossibilitar o cancelamento imediato de uma transação”.
Nesse sentido, a advogada destaca que o artigo 14º do Código de Defesa do Consumidor estabelece que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Ou seja, o fornecedor deve zelar pela segurança de seus serviços, aprimorando a sua prestação a fim de que seja possível atender às necessidades dos consumidores.
“Cada golpe tem suas peculiaridades e isso pode intervir diretamente na responsabilidade ou não da Instituição Financeira”, explica Fernanda, lembrando que após o lançamento do PIX registrou-se aumento de 39% nos sequestros-relâmpago, no país.
Flávia Bortolini, advogada especializada em Direito Digital e Proteção de Dados, sócia do Damiani Sociedade de Advogados, observa, por sua vez, que o Bacen, respondendo a essa onda crescente de golpes, anunciou dia 27 de agosto algumas mudanças no PIX, que deverão ser adotadas pelos bancos nas próximas semanas. Dentre elas está a escolha de um limite de transferência pelo usuário, a redução no limite para transferência no período noturno para apenas R$ 1.000,00 e cadastro prévio de contas que possam receber transferências em valores acima do estabelecido pelo usuário.
“Contudo, não basta apenas confiar nas medidas impostas pelo Bacen. O usuário deve sempre adotar certos cuidados ao utilizar suas plataformas: usar senhas com grau de dificuldade elevado, não compartilhar senhas com terceiros, utilizar autenticação em duas etapas nos aplicativos e limitar o valor de transferência são boas práticas que devem ser adotadas”, destaca. Afinal, comenta, “não há como alterar o conceito de uma transferência imediata entre contas, porque tal mudança afetaria o espírito basilar do PIX, que é de trazer mais praticidade no dia a dia”.
As tentativas de fraudes e golpes financeiros mais comuns com o Pix são:
Phishing
Usam mensagens que aparentam ser reais para que o indivíduo forneça informações confidenciais, como senhas e números de cartões.
Clonagem de WhatsApp
De posse do código de segurança do app, a conta é replicada em outro celular. A partir daí, os criminosos enviam mensagens para os contatos da pessoa, fazendo-se passar por ela, pedindo dinheiro emprestado por transferência via Pix, por exemplo.
Engenharia Social no WhatsApp
O criminoso escolhe uma vítima e copia sua foto nas redes sociais. Depois, envia mensagens para os contatos dela, informando que teve de trocar de número. Assim, aproveita e pede uma transferência via Pix, dizendo passar por alguma emergência.
Falsos funcionários
A vítima recebe o contato de um suposto funcionário do banco ou empresa financeira oferecendo ajuda para cadastro da chave Pix, ou afirmando a necessidade de realizar algum teste, induzindo a realização de uma transferência.
Falso sequestro
Autor entra em contato com a vítima afirmando que sequestrou algum familiar e pede uma quantia para liberá-lo. O golpista aproveita o desespero da pessoa para convencê-la a fazer a transação.
Golpe do Bug
Aproveita da má-fé da vítima, pois espalha notícias de que o Pix está com alguma falha no funcionamento e é possível ganhar o dobro do valor transferido. Ao tentar tirar proveito dessa ação, a vítima enviará dinheiro para os criminosos.
Fonte: Febraban