O Senado aprovou, no último dia 10, a revogação da Lei de Segurança Nacional (LSN) e a criação de dez novos crimes contra o Estado democrático de Direito. O texto agora depende da sanção do presidente Jair Bolsonaro.
Advogados ouvidos pela Gazeta do Povo analisaram as consequências da medida.
“Todo e qualquer inquérito aberto com base na lei revogada será imediatamente extinto. Isso porque a retroatividade da lei penal benéfica é princípio constitucional e também lei ordinária federal, no artigo 2.º do Código Penal”, diz o advogado criminalista Daniel Gerber.
O artigo 2.º do Código Penal diz que “ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória”.
Segundo Gerber, isso significa que mesmo quem tenha sido punido com base na Lei de Segurança Nacional terá a pena extinta caso o processo não tenha transitado em julgado — ou seja, sem possibilidade de recursos judiciais.
BOLSONARO
O presidente Jair Bolsonaro e alguns de seus apoiadores também se beneficiarão com a extinção da LSN. Mas isso não significa que vão se livrar dos inquéritos a que respondem. Isso porque alguns tipos penais nos quais estão enquadrados não deixarão de existir.
“Os inquéritos que contemplam a investigação de outros delitos continuam válidos. Efetivamente, a prática daquele que estava previsto na Lei de Segurança Nacional é que deixará de ser investigado”, afirma Gerber.
NOVA LEI
A lei que substituirá a LSN tem apenas 10 crimes, contra 22 da lei anterior. Alguns tipos criados são semelhantes ao da LSN. Há, por exemplo, o crime de “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”, com pena de 4 a 8 anos de prisão. Trata-se de crime semelhante ao previsto na LSN de tentar “mudar a ordem, o regime vigente ou o Estado de Direito”, com pena de 3 a 15 anos.
O criminalista Daniel Bialski diz que quem respondia por esse crime não poderá ser reenquadrado na nova lei, com o tipo penal semelhante. “Como advogado, sempre vou dizer que é inaplicável. Como promotor, poderia forçar uma interpretação de que a conduta se assemelha e que haveria uma discussão sobre amplitude da revogação. Como mestre do Direito, direi que a norma revogada deixa de existir. Se tiver alguém condenado, pode entrar com uma revisão criminal dizendo que o crime não existe mais no Brasil”, explica.
Bialski, no entanto, alerta para outra possibilidade. Se Bolsonaro vetar o artigo 4.º da nova lei, que revoga a LSN, as duas normas iriam conviver. Em tese, os tipos penais antigos continuariam em vigor e os inquéritos baseados neles permaneceriam válidos. Ainda nesse caso, a antiga lei poderia cair, pois que já tramitam no STF diversas ações para declarar sua inconstitucionalidade. Elas só não foram julgadas porque a nova lei prevê a revogação, o que levaria à perda de objeto do julgamento.
Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil