A sucessão empresarial pode se tornar um problema, ainda para aquelas companhias que são constituídas por famílias. Especialistas advertem que um bom planejamento sucessório é crucial para a sobrevivência do negócio.
“No Brasil, boa parte das empresas é controlada por famílias específicas: esse é o grande modelo de companhia brasileira”, observa o advogado e especialista em Direito Empresarial Marcelo Godke. “É importante fazer um plano de sucessão dez anos antes, que seja executado ao longo do tempo. Assim o plano vai sendo testado para ver se, efetivamente, está funcionando.”
Para haver mais eficiência em todo o processo sucessional, uma solução é profissionalizar a gestão da empresa familiar, diz Godke. “Chega um determinado momento, às vezes, em que o fundador percebe que não vai ter para quem passar a empresa. Neste caso, o mais comum é contratar uma consultoria, um bom escritório de advocacia, para revisitar a parte de governança ou criá-la por meio de um conselho de administração. Assim o fundador vai se preparando aos poucos — e até coloca outros conselheiros que sejam independentes, profissionais, que não tenham tanta proximidade com a família.”
Já o advogado e também especialista em Direito Empresarial Fernando Brandariz, presidente da Comissão de Direito Empresarial da subseção Pinheiros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), salienta que, “nas empresas formadas por famílias, um dos maiores desafios da sucessão empresarial é o da preservação do negócio e do patrimônio”.
Diante desta realidade, Brandariz reitera que o planejamento sucessório é ferramenta crucial. “É importante inserir regras claras e objetivas quando do falecimento do patriarca e expressar o que deverá ser feito com as cláusulas contratuais desse sócio falecido. As cotas serão transferidas para os herdeiros ou não? Se há herdeiros-sócios e herdeiros não-sócios, o que fazer? O sócio é obrigado a ser sócio do filho do sócio falecido? Muitas vezes é interessante também inserir cláusulas que determinem o que deverá ser feito em eventual separação dos sócios”, complementa.
Marcelo Godke concorda. “A falta de planejamento leva, via de regra, à derrocada da empresa, porque as coisas acontecem do dia para a noite. Além disso, o planejamento não é só a questão do patrimônio em si: é a questão da continuidade da própria empresa. É crucial planejar que aquela atividade passe a ser coordenada, administrada por uma outra pessoa que deve ficar lá por um bom tempo no cargo. Mesmo fazendo um planejamento, há sempre um risco — mas, sem planejar, a chance de uma empresa desaparecer no futuro acaba sendo bastante grande.”
Neste processo, Brandariz afirma que o contrato social é parte fundamental do planejamento. “É no contrato social -ou acordo de cotistas- que estarão disciplinadas as regras de sucessão e separação, por exemplo”, explica.
Godke adverte, porém, que o contrato social é um instrumento “muito básico, que contém algumas regras de governança, mas às vezes inadequado para tratar da sucessão”. “No estatuto social de uma sociedade anônima ele é menos adequado ainda, porque a sociedade tem uma estrutura um pouco diferente. Em um contrato social, podemos dizer que, se houver o falecimento de um dos sócios, a família vai entrar no lugar dele, por exemplo, ou não.” Para o advogado, o ideal é que o planejamento e a implementação da sucessão não fiquem só nesse documento. “O contrato social ou o acordo de cotistas são, na verdade, instrumentos de execução de um planejamento prévio. Então o mais importante é o planejamento. Eu utilizaria também um acordo de sócios, com finalidade um pouco mais abrangente do que o contrato social -que é importante, mas acaba sendo uma parte pequena na implementação. E há outras modalidades e outros instrumentos para fazer isso.”
Godke acrescenta um dado preocupante sobre as empresas familiares. “Já se sabe, hoje, que nas empresas familiares o êxito de sucessão -passando da primeira geração para a segunda- é menor do que 30%; e da segunda para a terceira geração, por sua vez, esse dado cai para menos de 5%.”