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MPF pede teste para Covid em voos domésticos

Órgão entrou com uma ação civil pública na Justiça Federal do Ceará

19 de fevereiro de 2021

O Ministério Público Federal entrou, nesta quarta-feira (17), com uma ação civil pública na Justiça Federal do Ceará pedindo que a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e a União exijam o exame de Covid-19 para passageiros e tripulantes em voos nacionais.

Os procuradores defendem que sejam proibidos de embarcar aqueles que não apresentarem exame de detecção do tipo RT-PCR com resultado negativo para o novo coronavírus, feito com antecedência máxima de 72 horas da partida do voo ou de seu desembarque.

Especialistas divergem sobre o tema. Enquanto alguns entendem que a pandemia justifica a adoção de medidas excepcionais, outros veem a proposta como inócua.

Para Marcus Vinicius Macedo Pessanha, sócio do Nelson Wilians Advogados, especialista em Direito Público Administrativo e Regulatório, trata-se de limitação à liberdade de locomoção baseada no poder de polícia sanitário, “com vistas a evitar a disseminação do coronavírus desordenadamente pelo país”. “É uma restrição excepcional e por prazo delimitado, prevista inclusive na Lei nº 13.979/2020, a lei da pandemia”, diz.

Felipe Bonsenso, especialista em Direito Aeronáutico, critica a iniciativa. “Não há nenhuma comprovação de que aeronaves são mais propícias para disseminação do vírus. Pelo contrário: a alta tecnologia empregada nos sistemas de filtros e reciclagem de ar coloca a aviação em posição mais segura do que transporte rodoviário e metroviário”, diz.

Bonsenso também alerta para os impactos financeiros da medida. “Exigir teste PCR em voos domésticos e em voos privados é desproporcional e descabido, prejudicando a atividade das empresas aéreas e podendo ocasionar redução na demanda. Em linhas gerais, voos privados são realizados sem comercialização de assentos e nada difere do cidadão que dirige de uma cidade a outra. Questiona-se, portanto, a real efetividade da medida face aos prejuízos que poderá causar para consumidores e empresas, bem como em questão de proporcionalidade com outros meios de transporte. Vale notar que medidas equivalentes chegaram a ser discutidas nos Estados Unidos e não prosperaram, limitando-se a exigência de teste PCR para voos internacionais apenas, com objetivo de evitar propagação do vírus entre países, além de voos geralmente mais longos”, comenta.

Vera Chemim, advogada constitucionalista e mestre em Direito Público Administrativo pela FGV, lembra que a livre locomoção é garantida pelo inciso XV do artigo quinto da Constituição Federal de 1988, que trata das garantias e direitos fundamentais individuais e coletivos. Por outro lado, esta pode ser restringida, “desde que dentro dos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade”.

“Por sua vez, o MPF tem a competência e responsabilidade com o interesse público, o que justifica o pedido de apresentação de teste para a Covid perante a Justiça, levando em conta o agravamento da crise. A Lei 13.979/2020, em seu artigo segundo, disciplina as medidas para enfrentamento da crise sanitária, entre elas, o isolamento e a quarentena, ambas prevendo a separação de pessoas doentes ou contaminadas, assim como as bagagens e meios de transporte no sentido de evitar a contaminação ou a propagação do vírus. Na mesma direção, o artigo terceiro prevê determinação de realização compulsória de exames médicos e testes laboratoriais”, explica Chemim.

A advogada acredita que a Justiça pode dar provimento à ação, “visando a proteção das pessoas por um tempo determinado e desde que não afete ou prejudique desproporcionalmente a sua liberdade de locomoção e rotina”. “Em síntese: atendidos os princípios da razoabilidade e proporcionalidade em consonância com a CF-1988 e a Lei 13.979/2020, creio que a medida não afrontaria a Constituição, até porque seria excepcional e temporária”, complementa.

Daniel Gerber, advogado criminalista, sócio no escritório Daniel Gerber Advogados Associados, vê a medida como “ilusória”. “É mais uma ilusão de grandiosidade do Ministério Público Federal, que ignora os dados da vida real, o conceito de liberdade de ir e vir, e acredita em ilusões, como se fosse possível uma testagem de tal porte em todas as cidades de onde partem ou para onde chegam voos. Ainda pior é perceber o MPF considerar que, ao se realizarem tais exames, a situação estará efetivamente controlada, ignorando ônibus e metrôs lotados, favelas e aglomerações de pessoas – cada vez mais uma realidade em todo o território nacional. Tal medida é verdadeiramente kafkaniana, resultará em uma quebra ainda maior das já combalidas companhias aéreas, e apenas retrata uma ilusão de poder que, infelizmente, acomete alguns dos integrantes de tão respeitada instituição”, diz Gerber.

Adib Abdouni, especialista em Direito Constitucional e Criminal, entende que ação do MPF só ocorre devido à “inércia do Poder Público”. 

“Diante da ausência de uma política sanitária contundente de caráter nacional para conter a disseminação da pandemia (notadamente em relação às novas cepas da Covid-19 que apresentam maior grau de transmissibilidade), a inércia do Poder Público autoriza o Ministério Público Federal (dotado de competência legal para zelar pelos direitos assegurados na Constituição Federal relativos às ações e aos serviços de saúde) a vindicar junto ao Poder Judiciário a tutela jurisdicional apta a resguardar a saúde pública – a exemplo da exigência dos testes prévios de detecção da doença. Sem que isso implique em malferimento a direitos constitucionais alusivos à garantias individuais do cidadão, tendo em vista a excepcionalidade e transitoriedade da medida resultante da implementação de mecanismos limitativos de direitos para o enfrentamento da situação emergencial”, diz Adib.

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