A Câmara dos Deputados aprovou, na última terça-feira (9/4), o Projeto de Lei nº 2.796/2021, que cria o marco legal para a indústria de jogos eletrônicos. O texto agora aguarda sanção da Presidência da República. Para o especialista Daniel Becker, diretor de Novas Tecnologias no Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem e membro das Comissões de 5G e Assuntos Legislativos da OAB-RJ, o texto é superficial em diversos pontos e os objetivos da futura nova lei só se cumprirão com fiscalização efetiva.
“Embora os incentivos fiscais e benefícios propostos sejam louváveis, só se tornarão reais com implementação e fiscalização eficaz, direcionando os recursos de forma transparente para impulsionar o crescimento da indústria nacional”, argumenta.
O PL cria a possibilidade de empresas receberem fomento da Lei Rouanet, criando meios para estimular a produção e coprodução de jogos eletrônicos brasileiros independentes. A ideia da proposta foi promover a indústria nacional de jogos eletrônicos e a formação profissional no setor. Além disso, o texto traz definições para a fabricação, importação, comercialização e desenvolvimento dos jogos eletrônicos. O tema é considerado uma das pautas prioritárias para o Ministério da Cultura.
Segundo Daniel Becker, sócio do BBL Advogados e especialista em Regulação de Novas Tecnologias, a aprovação representa avanço regulatório significativo no panorama nacional, reconhecendo a importância econômica e cultural desse setor. Mas o texto ainda tem lacunas que requerem atenção para se garantir um desenvolvimento sustentável, ético e inovador na indústria de games.
Becker alerta para a necessidade de evitar que conceitos genéricos do texto deem margem para interpretações errôneas, e cita o exemplo da classificação de fantasy games. “O risco é de exclusão de uma parcela significativa de títulos e gêneros, o que prejudicaria a diversidade e inovação do setor”.
Conteúdos inadequados
O PL 2.796/2021 considera ainda livre a fabricação, importação, comercialização, desenvolvimento e o uso comercial de jogos eletrônicos. O Estado deverá fazer a classificação etária indicativa dos jogos, mas não será necessária autorização para o desenvolvimento e a exploração. Já as ferramentas de compras dentro dos jogos deverão restringir transações comerciais por crianças, que precisam contar com o consentimento dos responsáveis.
Jogos voltados para crianças e adolescentes com interação entre usuários via texto, áudio ou troca de conteúdos também deverão oferecer salvaguardas para proteger os usuários, como sistemas de reclamações e denúncias. Os termos de uso proibirão práticas que violem os direitos de crianças e adolescentes, e as ferramentas de supervisão e moderação parental terão que ser atualizadas periodicamente.
Para Daniel Becker, o Marco Legal peca ao abordar, de forma pouco eficaz, as questões relacionadas à proteção de crianças e adolescentes. “O PL precisa ser mais claro e assertivo quanto às medidas de segurança e restrição de conteúdos inadequados para essa faixa etária, especialmente em jogos multiplayer online, onde há interação com usuários de diferentes idades”, afirma. Outro ponto crítico, segundo ele, diz respeito à falta de orientações claras sobre funcionalidades específicas nos jogos que possam impactar diretamente crianças e adolescentes, como compras, propaganda direcionada e mecanismos baseados em sorte.
“Embora o texto reconheça a importância da inovação e do desenvolvimento de jogos brasileiros, é importante ir além de medidas genéricas e investir em iniciativas concretas para estimular a criatividade e a competitividade da indústria nacional”, diz o advogado. “Há falta de flexibilidade da normativa para empresas de jogos de menor porte, que demandam mecanismos de apoio específicos, como acesso a financiamentos e incentivos fiscais personalizados”.
Daniel Becker alerta que o marco legal não pode ser um documento estático e o legislador deve acompanhar a evolução dessa indústria e as demandas da sociedade. “O debate deve adotar um tom experimentalista e pedagógico, com diálogo aberto e inclusivo para todas as partes interessadas, desde representantes da indústria de jogos até especialistas em educação e desenvolvimento infantil e organizações da sociedade civil”, avalia. “Num recorte micro, o foco deve ser a promoção de práticas educativas e de conscientização, para criar um ambiente seguro para os jovens jogadores. Já no recorte macro, o objetivo deve ser o fomento tecnológico e econômico, em vez da adoção cada vez mais tradicional no Brasil de um ‘approach punitivo’.”
Com informações da Agência Câmara.