Empresas devem prestar atenção às novas regras para preços de transferência trazidas pela Instrução Normativa 2.161/2023, recentemente editada pela Receita Federal do Brasil (RFB), uma vez que o cumprimento será obrigatório a partir de 2024. Esta é avaliação de tributaristas, que destacam como principal ponto positivo na nova legislação a estipulação de prazos e o alinhamento às diretrizes da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
As novas normas regulamentam as disposições contidas na Lei 14.596/2023. Ana Lucia Marra, sócia da área de Tributos Diretos e Tributação Internacional do Machado Associados, explica que, em grande parte, a IN 2.161 repetiu as disposições da minuta divulgada no início de julho de 2023. Entretanto, após o recebimento de contribuições das partes interessadas, algumas importantes alterações foram implementadas no texto.
Aspectos práticos para aplicação das novas regras
As disposições da IN 2.161 detalham as diversas análises a serem feitas e procedimentos a serem adotados pelo contribuinte para o cumprimento das novas regras de preços de transferência que, em linhas gerais, requerem que o contribuinte comprove, para efeitos de apuração de IRPJ e CSLL, que os termos e as condições de uma transação realizada entre partes relacionadas estejam alinhados àqueles que seriam estabelecidos por partes não relacionadas em transações comparáveis. “As práticas associadas à implementação das novas regras revelam a importância de avaliar não só os documentos existentes, mas também as evidências da conduta efetiva das partes”, diz Ana Lúcia.
Adoção antecipada em 2023
A Instrução Normativa também regulamenta os prazos e a forma de opção pela adoção antecipada das novas regras de preços de transferência. A opção pela aplicação antecipada para 2023 deverá ser formalizada pelos contribuintes no período de 1º de setembro a 31 de dezembro de 2023 por meio de processo digital através do Portal do Centro Virtual de Atendimento da RFB (Portal e-CAC) e apresentação de termo de opção. “Trata-se de opção irretratável que resulta na aplicação das novas regras desde 1º de janeiro de 2023, inclusive das alterações quanto às regras de dedutibilidade de royalties”, explica a advogada.
Medidas de simplificação
A Lei nº 14.596/23 prevê a possibilidade de que a RFB estabeleça certas medidas de simplificação, as quais são especialmente importantes num cenário de mudança significativa das práticas adotadas ao longo de mais de 25 anos. As medidas de simplificação introduzidas pela IN 2.161 referem-se aos serviços intragrupo e à documentação a ser apresentada.
A IN prevê tratamento simplificado para as hipóteses de serviços intragrupo que se qualificam como de baixo valor agregado, os quais são caracterizados, dentre outros elementos, por não integrarem as atividades principais das partes e do grupo multinacional e terem natureza de atividades suporte. “De forma geral, nesse caso, o contribuinte poderá adotar uma abordagem simplificada das novas regras, sendo aceita remuneração que considere margem de lucro bruto de 5% sobre os custos diretos e indiretos relativos aos serviços de baixo valor agregado”, diz Ana Lúcia.
Commodities
Já Fernanda Approbato, advogada da área de Direito Tributário do BBL, considera que a IN 2.161/2023 aproxima a sistemática brasileira ao padrão utilizado pelos países membros da OCDE. “Também explicita os procedimentos que devem ser observados pelos contribuintes que desejam antecipar a aplicação do novo sistema dos preços de transferência ainda em 2023. No entanto, pontos envolvendo transações específicas, como aquelas relativas a commodities, não foram abrangidos pela norma e deverão ser objeto de regulamentação posterior pela Receita Federal”, afirma.
Na mesma linha, a tributarista Liz Marília Vecci, sócia fundadora do Terra e Vecci Advogados, afirma que a influência das diretrizes da OCDE na Instrução é notável. “Importante ressaltar, ainda, que a RFB, antes de elaborar o texto final da Instrução Normativa, considerou as sugestões dos contribuintes durante a Consulta Pública nº 01/2023, o que, do ponto de vista jurídico, é um passo importantíssimo para a viabilidade do novo regramento. Ou seja, é fundamental uma comunicação aberta entre a Receita e os contribuintes”, diz.
Liz Marília considera que as novas regras estabelecem métodos mais apropriados para as transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas, como, por exemplo, o Preço Independente Comparável (PIC) para as commodities, o Preço de Revenda menos Lucro (PRL) para revenda, o Custo mais Lucro (MCL) para indústria e serviços e a Divisão do Lucro (MDL) para transações envolvendo intangíveis ou em que haja contribuições únicas e valiosas.
Princípio da Plena Concorrência
A IN 2.161 foi toda pautada no Princípio da Plena Concorrência, também conhecido como “Arm’s Length Principle”, o que, de acordo com Liz Marília, “gera mais segurança jurídica nas transações entre empresas de corporações multinacionais”.
Maria Carolina Sampaio, sócia e head da área tributária do GVM Advogados, afirma que a IN era “ansiosamente” aguardada pelos contribuintes. “O objetivo destas normas é aproximar as regras brasileiras daquelas utilizadas internacionalmente, pelos países membros da OCDE, no que se refere aos preços de transferência, marcando uma nova era no Brasil, acerca do assunto. De qualquer modo, a Instrução se restringiu às regras gerais acerca do controle de preços de transferência. Mas alguns aspectos sensíveis para os contribuintes ainda estão pendentes de regulação, como questões relacionadas a operações envolvendo ativos intangíveis, serviços intergrupo e operações financeiras, por exemplo”, explica.