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Caso de mulher trans enterrada como homem cis pode gerar pedido de reparação

Para advogada, comunidade LGBTQIA+ foi atingida em sua coletividade

18 de outubro de 2021

Após um longo período internada no hospital, lutando pela vida em virtude de uma doença, Alana, mulher trans de 30 anos, foi enterrada no último dia 11, em Aracaju (SE), como um homem cisgênero – de barba, bigode e terno. A imagem surpreendeu amigos e revoltou a comunidade LGBTQIA+, já que a caracterização destoava completamente de seu gênero assumido durante a vida. 

Alana acabou adquirindo a barba no tempo em que esteve hospitalizada. Familiares que não aceitavam sua orientação sexual preferiram então manter essa imagem no velório.

À ConJur, advogadas apontaram uma série de possíveis crimes cometidos no caso. 

Cecilia Mello, criminalista e desembargadora federal no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) por 14 anos, lembra que a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 26) e o Mandado de Injunção (MI – 4733), julgados pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal em junho de 2019 (embargos de declaração pendentes de julgamento), tratam da exposição e sujeição dos integrantes da comunidade LGBTQIA+ a graves ofensas aos seus direitos em razão da ausência – por absurdo lapso temporal – de mandamentos de criminalização de atos de discriminação praticados  em razão da orientação sexual ou da identidade de gênero da vítima – em outros termos, a propagada ideologia de gênero.

“Restou decidido que, até que sobrevenha lei específica, ‘as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social’, ajustam-se aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716/1989, constituindo, também, motivo torpe na hipótese de homicídio doloso (CP art. 121, § 2º, I)”, explica Cecilia.

Ainda de acordo com Cecilia, a decisão se destinou a garantir aos integrantes do grupo LGBTI+ “a posse da cidadania plena e o integral respeito tanto à sua condição quanto às suas escolhas pessoais”. “Isso pode significar, nestes tempos em que as liberdades fundamentais das pessoas sofrem ataques por parte de mentes sombrias e retrógradas, a diferença essencial entre civilização e barbárie”, comenta.

REPARAÇÃO CIVIL

A advogada também vê espaço para um pedido de reparação civil. “O crime de racismo está previsto na Lei 7716/1989 e implica conduta discriminatória dirigida a determinado grupo ou coletividade e, geralmente, refere-se a crimes mais amplos. Entretanto, no rol das práticas que podem constituir crime de racismo, e que por extensão poderia ser aplicado, não há qualquer previsão sobre o desrespeito ao gênero, ao genuíno reconhecimento de si, por ocasião da morte. Sob outra vertente, embora não haja hipótese de equiparação criminal, soa muito evidente que a comunidade LGBTQIA+ foi atingida em sua coletividade, de maneira a justificar a reparação civil”, avalia.

Sofia Coelho Araújo, advogada criminalista, especialista em Direito Público, responsável pelo Núcleo de Violência de Gênero do escritório Daniel Gerber Advogados, entende que a questão que deve ser levada em conta é se Alana fez pedido expresso aos seus familiares de ser enterrada como mulher. 

“Se os responsáveis pelo trâmite do enterro atuaram com claro e indiscutível preconceito e com atitude discriminatória em relação à orientação sexual do ente falecido, assim como tinham conhecimento de que Alana teria solicitado expressamente a vontade de ser enterrada como mulher antes de sua morte, aí sim seria possível uma eventual ação alegando ofensa a diretos difusos, coletivos ou até mesmo o direito individual homogêneo, sendo esses os pré-requisitos para ingresso de uma ação coletiva”, opina.

 

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