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Advogados divergem sobre saída do MPF em acordos de leniência

Projeto concentra poderes de negociação na CGU e na AGU

3 de agosto de 2020

Fellipe Sampaio SCO STF

O governo e o Supremo Tribunal Federal finalizaram uma proposta sobre acordos de leniência, que funcionam como delações premiadas no mundo empresarial. O projeto retira o Ministério Público Federal das negociações e concentra poderes na Controladoria-Geral da União (CGU) e na Advocacia-Geral da União (AGU), órgãos subordinados ao governo. Advogados divergem sobre a saída do MPF no fechamento de acordos de leniência. 

Veja o que pensam advogados constitucionalistas e criminalistas sobre o assunto:

Vera Chemim, advogada constitucionalista

“O objetivo é aumentar significativamente o controle institucional sobre os atos do MPF em casos de acordos de leniência com as organizações empresariais envolvidas em corrupção. Trata-se de uma forma de retirar do MPF uma total autonomia quanto à celebração de acordos de leniência e ao mesmo tempo criar um novo arranjo institucional, aumentando sobremaneira o controle do Poder Executivo por meio dos seus órgãos de Justiça, com uma mudança na Lei Anticorrupção que, a julgar pela atual conjuntura política, certamente será aprovada pelo Poder Legislativo. Em síntese: após a Constituição Federal de 1988 ter dado autonomia ao MPF, o cenário agora é de reverter esse quadro tentando voltar ao antigo status quo.”

Marcelo Egreja Papa, especialista em Direito Penal e sócio do Bernardes Jr. & Advogados

“Nos últimos anos, vimos um crescimento exacerbado do poder do Ministério Público Federal. Agora, há uma tentativa de voltar o poder ao eixo. Parece que começamos a pender para o controle do poder estatal, o que é positivo num Estado Democrático de Direito”. 

José Luis Oliveira Lima, especialista em Direito penal e sócio do OL&D Advogados

“A ideia de um balcão único é defendida para garantir maior segurança jurídica para as empresas. Retirar o Ministério Público das negociações pode ser um retrocesso. Um acordo de leniência depende muito da colaboração das pessoas físicas, cuja maior preocupação são as possíveis penas de prisão que demandam negociação com o MPF.”

Cecilia Mello,  sócia do Cecilia Mello Advogados, especialista em direito administrativo e penal,  atuou por 14 anos como juíza federal no TRF-3

“A pluralidade de entes com legitimidade para celebrar os negócios jurídicos tem ocasionado descompassos entre as autoridades, redundando, inclusive na não aceitação por uma autoridade do acordo de leniência feito por outra. Mais do que isso, tem dificultado de forma significativa a celebração desses acordos.

Bom que se diga que os atos lesivos constantes da Lei Anticorrupção e da Lei de Improbidade somente poderão ser imputados à pessoa jurídica quando pessoas físicas executam os atos tipificados nos referidos diplomas legais no exercício de atividades profissionais, visando o interesse, o funcionamento e/ou os objetivos dessa mesma pessoa jurídica. A imputação desses fatos típicos à pessoa jurídica pressupõe necessariamente a constatação prévia da prática dessas ações pelas pessoas físicas que lhe sejam vinculadas.

Dessa forma, não parece que possa haver esvaziamento da competência e/ou atuação do Ministério Público, pois este permanecerá como o titular da ação penal a ser proposta contra as pessoas físicas que atuaram de modo ilícito no mundo fático. E os acordos de leniência têm estrita ligação com as práticas ilícitas de natureza penal correlatas. Aparentemente haverá um melhor delineamento de competências no âmbito da celebração dos acordos de leniência, considerando a competência constitucional da CGU e o disposto na Lei 13.844/2019 que lhe confere poder para as “providências necessárias à defesa do patrimônio público.”

Valdir Simão, sócio do Warde Advogados e especialista em Compliance, ex-ministro chefe da CGU e ex-presidente do INSS

“A proposta é um avanço para aperfeiçoar o instrumento do acordo de leniência e dar maior segurança jurídica a esse tipo de transação, mas ainda não é um balcão único, já que estão fora o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e o Banco Central. Por outro lado, a proposta preserva as competências do Tribunal de Contas da União em apurar um valor de dano ao erário que seja suplementar ao valor que foi previsto no acordo de leniência. De qualquer forma, é um grande avanço.”

Claudio Bidino, sócio do Bidino & Tórtima Advogados, mestre em Criminologia e Justiça Criminal pela Universidade de Oxford

“É muito bem vindo qualquer esforço voltado a trazer uma maior segurança jurídica para um tema tão carente de regulamentação, como é o caso dos acordos de leniência. O que me parece fundamental é que todos os  órgãos estatais que tenham poder sancionatório se sentem à mesa de negociação, proporcionando assim às empresas uma maior clareza dos efeitos que podem esperar desses acordos no âmbito penal e administrativo.”

Daniel Gerber, advogado criminalista com foco em compliance político e empresarial

“Sem sombra de dúvidas, o acordo de leniência deve ser de competência dos órgãos de regulação administrativa, como CGU, AGU e RFB. No entanto, não há motivos para se afastar o Ministério Público de tal negociação, eis que a instituição, responsável pelo acordo de colaboração premiada, detém interesse direto e legítimo tanto nos pressupostos quanto nas consequências do acordo ‘cível’. E, não fosse tal interesse, a participação e harmonização da colaboração premiada com a leniência é fundamental para o próprio destinatário da norma, seja ele pessoa física ou jurídica, na medida em que deverá avaliar globalmente os impactos da decisão colaborativa.”

Foto: Fellipe Sampaio / SCO / STF

 

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