Por Camila Somadossi e Ligia Valente*
O procedimento da recuperação judicial tem como premissa essencial a proteção da atividade empresarial, com a definição dos créditos devidos e a forma como estes serão adimplidos.
Nesse sentido, a Lei 11.101/05 regula quais os créditos que estarão abrangidos neste procedimento, ou seja, define que serão sujeitos ao processo recuperacional os créditos existentes, vencidos ou não vencidos, até a data do pedido de recuperação judicial.
Se sujeitos à recuperação judicial, esses créditos, quando da aprovação do plano de recuperação judicial, já em fase mais avançada do procedimento, serão renovados e pagos nos termos aprovados pelos credores.
Por outro lado, a Lei, em seu artigo 49, § 3º, também dispõe acerca dos créditos não sujeitos ao procedimento, sendo eles, em resumo, os créditos originados em momento posterior ao pedido, obrigações a título gratuito, créditos tributários, créditos de adiantamento de contrato de câmbio e créditos garantidos por alienação fiduciária e com garantia de reserva de domínio.
Não sendo sujeitos, os créditos poderão ser exigidos por ação própria, a depender da natureza do crédito, sendo desnecessário o pagamento deste nos termos do plano de recuperação judicial.
Apesar da aparência taxativa e descomplicada, em muitas ocasiões a discussão sobre a sujeição do crédito é complexa, podendo levar a discussões que se estendem por todas as instâncias e viabilizar, neste ínterim, inclusive, atos que levem à expropriação do patrimônio do devedor. Mas, neste caso, o que ocorre quando apenas a instância superior reconhece a submissão do crédito à recuperação judicial?
O reconhecimento da sujeição do crédito terá efeito extunc, retroagindo à data do deferimento do processamento da recuperação judicial, sendo que todos os atos expropriatórios, eventualmente autorizados para a satisfação do crédito, em ações que buscavam a satisfação individual, serão declarados nulos.
Desta forma, a retroatividade dos efeitos da decisão que defere o processamento da recuperação judicial é necessária para impedir que a satisfação de alguns créditos, em condições desiguais à de outros credores, inviabilize a reestruturação empresarial e impeça o princípio da paridade entre os credores.
*Camila Somadossi é advogada especialista da área Recuperação Judicial e sócia do escritório Finocchio & Ustra Advogados
*Ligia Valente é advogada especialista da área de Recuperação Judicial do escritório Finocchio & Ustra Advogados