Uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que tramita no Congresso tem como objetivo dar ao Parlamento o poder de alterar decisões do STF (Supremo Tribunal Federal) quando a sentença não for unânime. Bastaria um ministro divergir dos colegas para que o processo fosse remetido ao Congresso, que teria a última palavra sobre o caso.
A mestre em Direito Penal pela PUC-SP Jacqueline Valles explica que o artigo 2º da Constituição é cláusula pétrea, ou seja, não pode ser modificado. Esse é o dispositivo que estabelece que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são independentes e harmônicos entre si. Cabe ao Executivo administrar a máquina pública, na prestação direta de serviços à sociedade. O Legislativo cria leis que atendam aos anseios da população. Já o Judiciário é o guardião das leis, atuando quando há dúvida se elas estão sendo respeitadas.
A jurista afirma que não é possível modificar uma cláusula sobre a qual se baseia a democracia brasileira. “Um projeto como este não pode ser feito por emenda à Constituição porque prevê o enfraquecimento de um poder da República em relação ao outro. Pelo princípio da separação dos poderes um não está subordinado ao outro. Não se pode modificar a base estrutural da própria democracia”, esclarece.
A criminalista afirma ainda que já existem ferramentas de controle de todos os poderes, inclusive do Judiciário. “A Justiça não é intocável e pode, sim, passar por mudanças legais, desde que sejam constitucionais. A Constituição está acima de todos os poderes. Essa proposta não tenta mudar a Justiça, mas sim uma das bases fundamentais da Constituição”, alerta a jurista.
Se a PEC for aprovada na Câmara, ainda precisa ser votada no Senado antes de ser promulgada. Mas a tramitação pode ser contestada justamente no STF, que terá que decidir sobre um projeto que o envolve diretamente. “Naturalmente o Supremo deve considerar a PEC inconstitucional. Para uma mudança dessas seria necessário convocar uma nova Assembleia Constituinte, com deputados eleitos pelo povo exclusivamente para fazer uma Constituição completamente nova”, completa Jacqueline Valles.
Foto: Fellipe Sampaio / SCO / STF