Opinião

A regulamentação das publicações eletrônicas

Portaria 12.071, do governo, estabeleceu diretrizes para divulgação de resultados das companhias

27 de outubro de 2021

Por Suzana Camarão Cencin Castelnau, Arthur Barreto e Tomas Arruda*

Artigo publicado originalmente no Estadão

As formalidades relativas às publicações obrigatórias previstas pela Lei das S.A. (Lei nº 6.404/1976) são muito debatidas no meio empresarial, uma vez que representam altos custos para as sociedades. É importante ressaltar que a Lei das S.A. privilegia o princípio da publicidade, que dá acesso aos investidores, clientes, credores e cidadãos em geral às informações societárias das companhias com sede no Brasil.

Historicamente, a Lei das S.A. estabeleceu que todas as publicações deveriam ser realizadas no Diário Oficial do respectivo estado onde se localiza a sede da companhia, bem como em jornal de grande circulação, também no local da sede da companhia. Apesar da exigência, a Lei das S.A. sempre previu exceções com relação à necessidade de publicações, para não onerar sobremaneira empresas de menor porte. Assim, até 2019 somente as sociedades por ações com patrimônio líquido inferior a R$ 1 milhão e com, no máximo, 10 acionistas, estavam dispensadas de realizar as publicações na forma exigida pela Lei das S.A.

A partir de referido ano, seguindo uma série de medidas para o fomento da atividade empresarial, em 24/4/19 ocorreu a publicação da Lei 13.818, que alterou a redação do artigo 294 da Lei das S.A. para aumentar os limites acima mencionados, que passaram a ser de R$ 10 milhões e 20 acionistas.

Além disso, em 5/8/19 foi publicada a Medida Provisória nº 892, que havia alterado a Lei das S.A. para permitir que as publicações fossem feitas nos endereços eletrônicos da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), da respectiva entidade administradora de mercado (por exemplo, B3) e das próprias companhias. No entanto, referida Medida Provisória acabou sendo rejeitada pelo Congresso Nacional e não foi convertida em lei, perdendo a sua validade.

Finalmente, em 1/6/21, foi publicada a Lei Complementar nº 182, apelidada de “Marco Civil das Startups”, que alterou novamente o texto do artigo 294 da Lei das S.A. para autorizar que as companhias fechadas com receita bruta anual de até R$ 78 milhões substituíssem as tradicionais publicações no Diário Oficial e em jornal de grande circulação no local da sede da companhia por publicações eletrônicas, cabendo ao Ministério da Economia regulamentar a forma como deveriam ser realizadas. Esta foi uma inovação legislativa que teve como intuito melhorar o ambiente de negócios, sobretudo para startups, e que beneficia diversas companhias brasileiras, permitindo que referidas companhias possam optar por publicar apenas eletronicamente os seus atos, dispensando a publicação em jornal, o que representa economia e agilidade para referidas sociedades, medida que veio em boa hora, uma vez que ajuda as companhias a reduzirem custos e, ainda, moderniza o sistema, já que as pessoas estão cada vez mais conectadas e publicações eletrônicas vão em linha com a digitalização dos meios de comunicação.

Nos parece não ser uma coincidência que o parâmetro adotado pela nova redação da Lei das S.A. coincide com o limite para que as sociedades possam se enquadrar no regime do lucro presumido, que significa um regime de apuração simplificada dos tributos sobre o lucro (imposto de renda e contribuição social sobre o lucro “IRPJ/CSLL”), pelo qual se presume que um percentual determinado do faturamento representa o lucro da sociedade. A nosso ver, a adoção desse parâmetro é benéfica ao permitir delinear um regime jurídico mais completo e sistematizado para as pessoas jurídicas desse porte, combinando obrigações societárias e fiscais.

Os principais requisitos para que uma sociedade possa optar pelo lucro presumido são o faturamento abaixo de R$ 78 milhões anuais e que não ela não exerça atividades em ramos específicos, como bancos e empresas públicas. As empresas que utilizam esse regime têm seu lucro tributário apurado a partir de coeficientes que variam de acordo com o tipo de atividade que exercem, com os percentuais entre 1,6% até 32% sobre o faturamento; e sobre essa base de cálculo presumida é que se aplicam as alíquotas do IRPJ e da CSLL (aprox. 34% no total). Nesse sentido, vemos que a Lei Complementar nº 182/2021 quis incentivar empresas de até médio porte, que já se beneficiam de uma tributação simplificada e agora poderão beneficiar também de uma forma de publicação simplificada e menos onerosa.

Assim, como forma de regulamentar a Lei Complementar nº 182/2021 e fazer valer o regime simplificado de publicação, recentemente, em 7/10/21, o Ministério da Economia editou a Portaria de nº 12.071, publicada em 13/10/21, definindo que as publicações eletrônicas determinadas pelo artigo 294 da Lei das S.A., possíveis para companhias fechadas com receita bruta anual de até R$ 78 milhões, deverão ser realizadas na Central de Balanços do Sistema Público de Escrituração Digital (“SPED”) e nos respectivos endereços eletrônicos das companhias.

A citada Portaria define ainda que as publicações serão isentas de qualquer custo e deverão ser assinadas eletronicamente por certificado digital, o que permitirá garantir sua autenticidade. Lembramos que o SPED é um ambiente eletrônico vinculado à Receita Federal do Brasil que reúne o envio de diversas obrigações de natureza fiscal e contábil, tendo por objetivo reduzir a complexidade no cumprimento de obrigações e os custos para as empresas daí decorrentes, além de facilitar às autoridades fiscais o cruzamento de dados e informações.

Por fim, é importante destacar que as publicações das companhias fechadas com receita bruta anual superior a R$ 78 milhões e para as companhias abertas permanecem com as mesmas formalidades anteriormente requeridas.

*Suzana Camarão Cencin Castelnau é sócia do escritório Donelli e Abreu Sodré Advogados – DSA

*Arthur Barreto é advogado tributarista do escritório Donelli e Abreu Sodré Advogados – DSA

*Tomas Arruda é advogado de societário e contratos do escritório Donelli e Abreu Sodré Advogados – DSA

Notícias Relacionadas

Opinião

Open Banking e LGPD: desafios e modelo do setor

Assunto deve ser conduzido com responsabilidade e respeitando a privacidade dos clientes

Opinião

Desafio do terceiro setor passa por mudanças culturais e estruturais

Será que a sociedade está apta a receber aqueles em situação de vulnerabilidade?