Opinião

Fornecimento de energia elétrica em construções irregulares nas APPs: entenda a decisão do STJ

Bom senso e tecnicidade para avaliar se uma APP tem função ambiental devem prevalecer nas decisões

Por Renata Franco de Paula Gonçalves Moreno

A discussão sobre imóveis irregulares em Área de Preservação Permanente (APP) ocorre há um tempo e é responsável por divergências entre tribunais e doutrinadores.

O Direito brasileiro, em regra, proíbe a construção de qualquer tipo de edifício ou imóvel nas APPs, tendo em vista sua destinação à proteção do solo, dos recursos hídricos e das pessoas e propriedades, salvo quando a construção for de utilidade pública, interesse social ou intervenção de baixo impacto ambiental.

No entanto, apesar da proibição, é fato que existem diversas edificações irregulares nas áreas de preservação permanente. Assim sendo, é necessário entender como agir diante dessas situações.

A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça proibiu uma concessionária de serviço público no estado de Santa Catarina de fornecer energia elétrica a imóveis irregulares. Isso porque o Ministério Público de Santa Catarina ajuizou ação com o intuito de impedir o fornecimento de energia elétrica aos imóveis irregulares nas APPs que já recebem a rede elétrica.

Apesar da sentença proibir a concessionária de fornecer energia, houve, no julgamento da apelação, decisão no sentido de que não prestar o serviço seria ilegal, principalmente porque o imóvel está localizado em área consolidada que possui imóveis com acesso à rede de energia.

Ocorre que a votação foi unânime para reformar o acórdão do TJ-SC, a fim de restabelecer a sentença de primeiro grau que proibiu o fornecimento de energia elétrica.

Foi abordado que a situação é de “mitigação fática de proteção ambiental na localidade” e ainda que é consolidado na jurisprudência a proibição de ocupação ou construção em APPs, sendo esse entendimento inafastável.

Considera-se essa uma situação bastante delicada e, até mesmo, controversa, pois o Estado não deveria permitir edificações nessas áreas especialmente protegidas. Essa medida, de fato, coíbe a construção nessas regiões. O problema surge em locais onde há controvérsia sobre a definição de Área de Preservação Permanente (APP) ou onde houve urbanização no passado e que hoje se encontram descaracterizadas como APP, por exemplo, as margens de rios nos centros urbanos, como o Tietê e o Pinheiros em São Paulo. São áreas que, pela lei, são APPs, mas já estão consolidadas e sem função ambiental.

O risco é que se passe a ter decisões de que essas áreas seriam APPs (como a lei prevê) e, portanto, não seriam passíveis de fornecimento de energia elétrica. Portanto, o bom senso e a tecnicidade para avaliar se uma APP tem função ambiental devem prevalecer nas decisões. De todo modo, é importante adotar medidas que coíbam as ocupações irregulares, muitas vezes negligenciadas pelo Poder Público.

*Renata Franco de Paula Gonçalves Moreno, especialista da área ambiental e regulatória, sócia e fundadora do escritório Renata Franco Sociedade de Advogados.

 

Notícias Relacionadas

Opinião

Por que a recuperação extrajudicial ainda é subutilizada no Brasil?

Ferramenta, devidamente desenvolvida e promovida, poderia ter um uso mais amplo

Opinião

Prova ilícita no processo penal: próximos capítulos do caso “vaza jato”

Bastidores da operação precisam ser submetidos a escrutínio público