*Notícia publicada originalmente no site da Veja
Por Matheus Leitão
Coleção recente de derrotas judiciais, notas técnicas e pareceres desfavoráveis pressiona a empresa indonésia Paper Excellence que, desde 2017, tenta fincar os pés no setor brasileiro de papel e celulose. O grupo indonésio busca efetivar a compra da Eldorado, uma das maiores produtoras de celulose do país e fundada pelos empresários Joesley e Wesley Batista. Mas a disputa se estende desde que uma arbitragem mal conduzida virou várias batalhas judiciais e outra administrativa.
O contrato com a J&F estabelecia que a Paper teria um ano para concluir a compra de 100% da Eldorado. Sem o capital integral em mãos, partiu para a arbitragem, que se transformou num dos mais comentados conflitos do mundo corporativo. As acusações de espionagem e suspeição de um dos árbitros envolvidos no processo geraram uma briga judicial que se arrasta no Tribunal de Justiça de São Paulo, que vinha decidindo em favor da Paper.
Mas uma decisão liminar no Superior Tribunal de Justiça suspendeu o julgamento, dando razão à J&F. A empresa recorreu a corte argumentando que a juíza responsável pela ação da empresa (em busca da anulação do negócio) em primeira instância a sentenciou enquanto valia a decisão de um desembargador que suspendeu o andamento do processo.
O caso de Anderson Schreiber, colocado sob suspeita pela J&F na arbitragem, voltou à mira do Ministério Público do Rio de Janeiro, que determinou a reabertura do inquérito contra ele. Schreiber também fez parte de uma bilionária disputa da Petrobras e foi afastado do processo pela empresa. Na análise do MPRJ, os dois casos são vistos dentro de uma “atuação sistemática de Anderson Schreiber, omitindo informações cruciais em vários casos de arbitragem”.
A lista de revezes recentes da Paper na Justiça
Do Superior Tribunal de Justiça, veio a ordem da ministra Daniela Teixeira para o desarquivamento do inquérito que apura o hackeamento de 70 mil e-mails trocados entre executivos, diretores e advogados da J&F e da Eldorado Celulose. A Polícia Federal, segundo a ministra, deve conduzir as investigações que têm a Paper como suspeita de ordenar a espionagem.
Em uma ação popular que tramita no Tribunal Regional Federal da 4a Região questionando a aquisição de áreas rurais pela Paper sem autorização do Congresso, como determina a lei, o procurador da República Fábio Nesi cunhou que a alegação da empresa de que os imóveis seriam destinados à finalidade industrial não pode ser acolhida. “Essa atividade é claramente agroflorestal, portanto a lei brasileira sobre aquisição de terras por estrangeiros deve ser aplicada”, destacou.
Em outra ação, que tramita na justiça federal no Mato Grosso do Sul, o Ministério Público foi enfático na manifestação. “O MP não vai interferir em um negócio privado, pois não é nosso escopo tratar essa parte empresarial. Mas temos interesse único e exclusivo em defender e resguardar o território nacional”.
O conflito e os revezes para os indonésios não se limitam à fronteira forense.
A autorização prévia exigida por lei para aquisição ou arrendamento de áreas rurais por empresas equiparadas à estrangeira, caso da Paper, deveria ter sido solicitada ao Congresso Nacional e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Para além do que a empresa dos irmãos Batista alega nos processos, há um fato assumido pela Paper. Os indonésios reconhecem não ter seguido as regras, mesmo cientes de que as áreas arrendadas pela Eldorado antes da assinatura do contrato superavam 200 mil hectares, território maior que a cidade de São Paulo.
A autarquia está próxima de encerrar um processo administrativo em que a ausência das solicitações fundamentou uma nota técnica que aponta a nulidade de pleno direito do contrato como consequência direta do “esquecimento”. Os indonésios argumentam que nunca tiveram a intenção de ficar com a posse das terras, mas o recurso que apresentaram foi rejeitado e a questão será definida em reunião colegiada ainda na primeira quinzena desse mês.
O posicionamento dos técnicos do INCRA sobre o caso foi mencionado em pareceres do MPF, decisões no TRF4 e tem o respaldo da Advocacia Geral da União, o que deixa o cenário desconfortável para a Paper.
Segundo a coluna Radar Econômico, de VEJA, alguns advogados que representam a empresa indonésia não escondem a insatisfação com o cochilo de colegas que teriam deixado de orientar a empresa a pedir autorização do Congresso Nacional antes de fechar o acordo para compra da Eldorado.
Se esse fosse um jogo de xadrez, considerando os últimos lances, os erros e acertos de cada lado, não seria precipitado dizer que o mate está mais próximo.
O que diz a Paper Excellence
A Paper Excellence adquiriu uma fábrica de celulose, em que a madeira é insumo e não a atividade principal, não sendo necessário, portanto, ter propriedades rurais ou arrendamentos de terras. Segundo parecer do ex-Advogado-Geral da União, Luís Inácio Adams, a Eldorado é uma empresa operacional cuja atividade principal é de fabricação e comercialização de celulose e papel e suas atividades empresariais não guardam características com quaisquer dos motivos que levaram às restrições impostas pela Lei nº 5.709 e que levaram a AGU a emitir o citado entendimento em 2010, durante a gestão de Adams.
O parecer do MPF é relativo a uma apelação contra a sentença que extinguiu liminarmente o processo em primeira instância e, caso seja aceita pelo órgão colegiado do TRF4, o processo voltará para nova análise do juízo de primeiro grau. O documento do MPF foi elaborado pelo mesmo procurador que já havia feito outro parecer com o mesmo teor, portanto não há novidade. O processo originário é uma ação popular ajuizada pelo ex-prefeito de Chapecó (SC), Luciano José Bulligon, em que ele pede a suspensão da venda da Eldorado, sob a alegação de que a Paper estaria negociando terras em Santa Catarina. Entretanto, nem a Paper nunca esteve no estado prospectando terras e nem tem interesse em adquirir terras em qualquer outra região do Brasil.
O pedido de tutela da J&F, que foi aceito pelo STJ, não traz novidades, sendo mais uma tentativa de se furtar ao cumprimento da sentença arbitral. As condenações que a J&F coleciona por litigância de ma-fé são o atestado de que a empresa tenta manipular a Justiça brasileira de acordo com seus interesses.
A Paper Excellence confia na Justiça brasileira e aguarda o desfecho do caso para assumir a Eldorado e realizar os investimentos na segunda fábrica que vai gerar milhares empregos e renda, contribuindo para o desenvolvimento econômico do Brasil.
Foto: Divulgação