Os requisitos do artigo 41 da Lei de Drogas – colaboração para identificar coautores e para recuperar o produto do crime – são alternativos, e não cumulativos. Assim, o acusado por tráfico que apenas auxilia as autoridades na apreensão da droga, sem apontar coautores do crime, faz jus à redução da pena prevista no dispositivo, que vai de um a dois terços.
Esse foi o entendimento da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar o caso de um homem flagrado com nove porções de maconha. De acordo com o relato dos policiais, ele confessou ser traficante e indicou o local onde ocultava o restante da droga, o que levou à apreensão de mais 50 porções.
“Isso não significa conceder ao acusado que identifica seus comparsas e ainda ajuda na recuperação do produto do crime o mesmo tratamento conferido àquele que só realiza uma dessas duas condutas, pois os distintos graus de colaboração devem ser sopesados para definir a fração de redução da pena”, destacou o relator do habeas corpus, ministro Rogerio Schietti Cruz.
Aplicando a redução de pena em razão da colaboração, o juízo de primeiro grau condenou o réu a três anos e dez meses de reclusão. Contudo, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) aumentou a pena para cinco anos, por considerar que a redução só seria possível se o acusado, além de indicar o local do produto do crime, tivesse identificado outros partícipes do esquema de tráfico.
Literalidade do texto não é suficiente
O ministro Schietti comentou que, embora a redação do artigo 41 da Lei 11.343/2006 traga a conjunção “e” entre os dois requisitos da redução de pena (identificação de coautores e recuperação do produto do crime), sugerindo serem cumulativos, a interpretação gramatical de um dispositivo legal nem sempre é a mais adequada para extrair a norma jurídica pertinente.
“Situações nas quais a literalidade do texto não é suficiente para extrair o adequado sentido da norma nele contida podem ser constatadas com frequência na legislação, em que não raro o legislador se vale da conjunção ‘e’ quando deveria empregar a conjunção ‘ou’, e vice-versa”, explicou.
Schietti lembrou que o atual artigo 41 da Lei de Drogas tem origem no antigo artigo 32, parágrafo 2º, da Lei 10.409/2002, o qual trazia a conjunção “ou” entre os requisitos da colaboração premiada. Além disso, mesmo na colaboração disciplinada pela Lei de Organizações Criminosas, a qual trata de crimes em que há o concurso necessário de pessoas, o legislador não impôs obrigatoriamente a identificação dos demais partícipes, de modo que não seria razoável exigi-lo nos crimes da Lei de Drogas, em que o concurso de pessoas é eventual.
“Além de não se identificar nenhuma justificativa para que tal mudança gramatical decorresse de propósito deliberado do legislador, não se pode desconsiderar o advento da Lei 12.850/2013, que cuidou de regular diversos aspectos relativos ao instituto da colaboração premiada, oportunidade em que, ao estabelecer seus requisitos no artigo 4º, o fez de forma alternativa”, declarou.
Colaboração do acusado foi essencial
O relator também observou que, segundo registrado no próprio acórdão do TJSP, não fosse a colaboração do acusado, apenas as nove porções de maconha que estavam em seu bolso teriam sido apreendidas e, nessas condições, seria bem provável o reconhecimento do porte de drogas para uso próprio, em vez do crime de tráfico.
Para o ministro, se a colaboração do acusado foi essencial para a comprovação do tráfico, está justificada a aplicação da causa de diminuição de pena, tal como decidido pelo juízo de primeiro grau.
Schietti ponderou ainda que, mesmo a confissão já tendo sido considerada para aplicar a atenuante da confissão espontânea em favor do réu, é possível adotar também a causa redutora de pena prevista no artigo 41 da Lei 11.343/2006.
“Isso porque a confissão, no caso, se limita à admissão da prática do tráfico de drogas, ao passo que a colaboração foi além e indicou aos policiais a localização do restante das drogas, que estavam escondidas e, segundo os próprios agentes afirmaram, não seriam por eles encontradas sem a ajuda do réu. Trata-se de institutos distintos e que devem ser aplicados conjuntamente, se ambos estiverem configurados” – concluiu o relator ao conceder a ordem de habeas corpus para restabelecer a sentença de primeiro grau.
*Com informações do STJ
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